domingo, 27 de março de 2016

FEEDBACK? SIM, POR FAVOR!



Para o feedback gerar benefícios, o ouvinte habilidoso é muito mais importante que o bom avaliador e até que o bom sistema de avaliação. Os especialistas Douglas Stone e Sheila Heen descrevem as três distorções comuns que solapam a habilidade de receber feedback.

Quando os líderes pensam em aperfeiçoar o feedback nas empresas, costumam optar por dois caminhos: implantar sistemas de gestão de desempenho e ajudar as pessoas a melhorar sua capacidade de dar feedback.

Ambos são relevantes, porém descobrimos que o mais importante na hora de determinar a eficácia do feedback é um terceiro caminho: a forma de recebê-lo.

Não importa que um líder seja a pessoa mais habilidosa do planeta para dar feedback; é o receptor que decide o que vai levar em conta. Um ouvinte capacitado e sensível pode tirar proveito de qualquer feedback mesmo quando este é falho.

Como ser um bom receptor

Busque três objetivos:
1. Converter sua vida em um longo aprendizado. Quando recebemos bem um feedback, responsabilizamo-nos por nosso aprendizado e podemos acelerar nosso crescimento. Aprender e crescer são profundamente satisfatórios em si, mas o ganho real é que nos sentimos melhores quando lutamos para realizar aquilo que é importante para nós. A organização também sai ganhando: com as habilidades individuais aperfeiçoadas no trabalho, a performance da equipe tem seu efeito multiplicado.
2. Aprimorar seus relacionamentos. A maneira como lidamos com o feedback impacta nossas relações cotidianas. Se estamos abertos, passamos duas mensagens: a de que somos confiáveis e a de que o crescimento é importante para nós. Na verdade, pesquisas mostram que quem solicita feedback –especialmente o negativo– tende a receber avaliações mais altas do que quem não o pede.

Evitar o feedback pode ser um desastre para os relacionamentos: as pessoas precisam discutir como seu comportamento as está impactando, e, se esse espaço não lhes for dado, uma tensão corrosiva minará a ligação.

O lado do avaliador
Não são poucas as dificuldades de uma pessoa realizar uma avaliação de desempenho e, ao mesmo tempo, ser justa, amigável e fazer o outro se sentir bem com isso. Não há nada errado com esses objetivos, mas a verdade é que não existe uma forma perfeita de dar feedback. As pessoas são muito complicadas para isso se resolver com um método.


Mais realista é escolher um método bom para você, tendo em mente que nenhum é perfeito e entendendo que o que faz esse processo evoluir melhor é todos os envolvidos estarem dispostos a mudar. Cada gestor deve investir em conversas de qualidade, e o colaborador tem de fazer o mesmo. Isso requer que os dois lados aprendam com o processo de feedback.

Assim, o avaliador deve estar disposto a fazer alterações em seu método se surgir um melhor e explicar-se quando rejeitar outros métodos que pareçam igualmente bons.
No final das contas, os dois grandes fatores que vão determinar a eficácia de sua performance de gestão são a capacidade individual de cada colaborador de receber o feedback e a capacidade coletiva de todos de discutir e resolver problemas juntos.

3. Reduzir o estresse e a ansiedade. Para os mais sensíveis, há um benefício importante: receber bem um feedback reduz o estresse e a ansiedade. Quando recebemos um feedback difícil e nos sentimos arrasados ou perdemos o eixo, o aprendizado é a última coisa que nos passa pela cabeça.
Melhorar a forma de lidar com o feedback também significa melhorar a maneira como encaramos os momentos em que estamos em pânico ou inseguros. Podemos ficar chocados na ocasião, mas também podemos aprender a olhar as coisas em perspectiva para nos recuperarmos mais rapidamente. Essa resiliência nos ajuda a encarar as conversas de feedback com menos medo.

POR QUE REJEITAMOS O FEEDBACK?
Como seres humanos, somos forçados a buscar aprendizado e crescimento. Isso é o que normalmente nos traz satisfação e realização na vida. É por isso que os videogames são tão viciantes. Contudo, ao mesmo tempo, também temos uma forte necessidade de aceitação –para nos sentirmos respeitados e seguros–, e por isso o feedback é um enigma.

O feedback pode ser muito ameaçador, porque a própria noção de feedback “construtivo” sugere que nosso jeito de ser “agora” não está muito bom. Pode ser doloroso saber como os outros nos enxergam, seja quando os comentários acertam o ponto, seja quando eles são uma injustiça terrível. É importante saber que nossa dificuldade de aceitar o feedback não está relacionada com um problema íntimo, e sim com a própria condição humana.

Em nossa pesquisa, descobrimos que as razões pelas quais as pessoas rejeitam o feedback podem ser divididas em três categorias –ou “gatilhos”. Cada um desses gatilhos é uma forma de desqualificar ou distorcer o feedback e, uma vez que os identifique em seu comportamento, você poderá mudar e descobrir como aprender com o feedback. Vale examiná-los:

Gatilhos da verdade. Em muitos casos, o feedback parece errado ou distante do real. Mas eis a dificuldade: você pode achar coisas erradas em qualquer feedback que receber. Talvez ele não resolva o problema do constrangimento e pareça ultrapassado, tendencioso, representando apenas a opinião de algumas pessoas ou sendo apenas um lado da história.

O desafio, quando focamos os problemas do feedback, é deixarmos de prestar atenção aos pontos que estão certos –e quase sempre há esses pontos.
Como recuperar seu eixo? Vá além da superfície. Não adianta dizer: “Recebi o feedback e agora vou melhorar”. Você não pode aceitar de verdade um feedback até que o compreenda, o que requer aprofundá-lo

Primeiro, deve-se entender de onde o rótulo veio –o que significa o rótulo para as pessoas? Segundo, é necessário saber aonde o feedback vai levar –o que, especificamente, as pessoas querem que o receptor faça diferente? Essas questões concretas mostram como um rótulo pode ser vago.

Receber bem um feedback não significa que você tem sempre de concordar com o que foi dito. Você deve é engajar-se nele, o que significa entendê-lo de fato. Você até pode dizer ao emissor: “Não me vejo dessa maneira. Que situações o levaram a ter essa percepção? E o que eu poderia fazer diferente para melhorar?”.

Ao final, é você que decidirá se vai agir conforme o feedback.

Gatilhos do relacionamento. Independentemente do feedback, às vezes existe algo sobre nosso relacionamento com o porta-voz que determina a forma como o recebemos. O mensageiro pode ser ingrato diante de nossos esforços ou não apreciar o que fazemos bem. Ou talvez nós não confiemos em sua expertise ou em suas intenções.

Nesse caso, não estamos descartando o feedback por seu conteúdo, mas por conta do emissor. Reagimos ao que pensamos sobre aquele indivíduo (“Ele tem motivos questionáveis” ou “Ele não tem credibilidade”) ou à maneira como somos tratados por ele (nos sentimos desvalorizados quando fazemos algo certo ou esse não é o lugar para nos dizer o que fazer). Seu feedback até pode estar correto, mas você realmente se importa?

Como recuperar seu eixo? Defina quais são os tópicos da conversa e fale separadamente sobre cada um. O melhor modo de lidar com a situação é explicitar a existência de vários problemas, sugerindo a discussão de cada um.

Gatilhos da identificação. Às vezes nos sentimos oprimidos pelo feedback, porque ele mina a maneira como nos vemos ou ameaça nossa sensação de segurança e bem-estar. O feedback avaliativo impacta a forma como imaginamos que os outros nos veem e pode trazer consequências negativas: se sua performance não atingiu as expectativas, talvez não consiga a promoção que estava esperando ou o bônus com que estava contando.
Nossa reação emocional, nesses casos, afeta a “história” que contamos para nós mesmos sobre o que o feedback realmente significou. E essa história pode distorcer o real sentido do feedback.
Podemos generalizar (“Eu perdi outro prazo” vira “Eu não consigo fazer nada direito”); a opinião de uma pessoa se torna a opinião de todo mundo (“Meu colega de trabalho está frustrado comigo” se transforma em “Todo mundo pensa que sou incompetente”) e o presente parece imutável (“Eu preciso aumentar minha coragem” se converte em “Eu sempre serei tão covarde quanto sou agora”).

Isso cria um ciclo de insegurança, e a história de “tudo/todos/para sempre” faz com que nos sintamos cada vez mais tristes, amedrontados e oprimidos.

Nesse estágio, estaremos chateados demais, não conseguindo aprender coisas importantes e úteis.
Como recuperar seu eixo? Desmonte as distorções. Para receber bem um feedback e recuperar-se após um contratempo, seu ponto de partida deve ser entender que tipo de distorção você costuma fazer. Você sabe quais são seus padrões nessa área?

Quanto mais entender seus padrões comportamentais, mais fácil será encontrar as técnicas para acabar com eles. Aqui vai um exemplo: em vez de ficar se perguntando “Sobre o que é esse feedback?”, liste tudo sobre o que ele não é. Por exemplo, quando você recebe o feedback de um colega dizendo que não gostou de seu relatório, pense: “Ele não está falando dos relatórios anteriores ou futuros, nem de como geri o projeto, nem de mim como colega”.

Sabendo sobre o que não é o feedback, você vence a insegurança e pode se preocupar com “sobre o que realmente ele é”, perguntando: “O que não estava bom em meu relatório? O que você esperava e por quê? Como você acha que eu poderia fazer um trabalho melhor?”.


Disponível em http://www.revistahsm.com.br/lideranca-e-pessoas/feedback-sim-por-favor/

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