“Ocorreu-me certa vez o
pensamento de que se alguém quisesse arruinar e destruir totalmente um homem,
infligindo-lhe o castigo mais terrível, algo que fizesse tremer o mais cruel
assassino e o levasse a se encolher por antecipação, bastaria obrigá-lo a dedicar-se
a um trabalho absolutamente desprovido de utilidade e sentido.”
(Fiódor Dostoiévski)
(Fiódor Dostoiévski)
Essa citação de Dostoiévski
evidencia a importância de encontrarmos sentido no trabalho. Para o filósofo
russo dedicar-se a um trabalho sem sentido é o castigo mais terrível. Aí fica a
pergunta: como encontrar um trabalho com sentido?
Antes de iniciarmos essa
conversa, gostaria de salientar um aspecto importante. Viktor Frankl, o
fundador da logoterapia (terapia baseada na busca por sentido) dizia que
sentido não é algo a ser dado, mas sim encontrado. A busca de sentido é algo
essencialmente individual e subjetiva. Encontrar propósito no que fazemos
envolve um processo infindável de reflexão, ação e experimentação.
Roman Krznaric, escritor e fundador da The School of Life, elencou cinco dimensões do sentido no trabalho em seu livro “Como encontrar o trabalho da sua vida”, são elas: ganhar dinheiro, alcançar status, fazer a diferença, seguir nossas paixões e usar nossos talentos. O dinheiro e status são os chamados motivadores “extrínsecos”, uma vez que tratam o trabalho como um meio para um fim, enquanto os demais são “intrínsecos”, com o trabalho valorizado como um fim em si mesmo. Trago aqui um resumo dessas cinco dimensões, para que cada um possa refletir sobre qual é a dimensão que lhe impulsiona.
1. Dinheiro e a boa
vida
Para o autor, escolher uma
carreira por causa dos benefícios financeiros é a motivação mais antiga e mais
forte no mundo do trabalho. Grande parte das pessoas estão no trabalho atual
devido ao salário e tem medo de buscar algo diferente por medo de uma redução
salarial significativa. O dinheiro pode nos apoiar na busca do sentido quando
nos dá liberdade para experimentar a vida e as oportunidades que surgem.
Contudo, muitas vezes, pode travar a busca por um trabalho com sentido quando
gera medo e nos mantém na zona de conforto. Afinal, como dizia Gandhi, “algemas
de ouro são muito piores que algemas de ferro."
Roman cita os achados das
ciências sociais modernas que evidenciam a falta de qualquer relação clara e
positiva entre renda e felicidade. O dinheiro nos mantém presos na cadeia
hedonista citada por Martin Seligman: à medida que enriquecemos e acumulamos
mais posses materiais, nossas expectativas aumentam, por isso trabalhamos ainda
mais para ganhar dinheiro a fim de comprar mais coisas, daí nossas expectativas
aumentam novamente e o ciclo não tem fim. Para a psicoterapeuta Sue Gerhart, a
busca por segurança em artigos materiais é consequência de falta de segurança
emocional.
O autor provoca a seguinte
pergunta: o que você mais gostaria de mudar sobre a sua atitude em relação
ao dinheiro?
2. Status
O status social é outra busca
extrínseca do ser humano. Roman cita duas variedades do status social. Uma
delas é ter um trabalho de prestígio que seja admirado pelos outros como o de
diplomata, advogado, médico, dentre outros.
A segunda variedade é o status
baseado em nossa posição em relação aos outros. Nessa variedade estamos o tempo
todo nos comparando com os outros. Se temos muitos amigos em cargos superiores
aos nossos, nos sentimos fracassados.
O risco de procurarmos sentido
por meio do status é buscarmos uma carreira que a sociedade considere
prestigiada, mas na qual nós não estamos realizados. Além disso, podemos ficar
presos à mesma cadeia hedonista, na qual uma posição almejada é substituída por
outra, num outro ciclo sem fim.
Para Roman, não devemos ficar
tão preocupados com o que as outras pessoas pensam de nós. E traz a seguinte
questão: quem você acha que está julgando o seu status – talvez a família,
velhos amigos, colegas? Você quer dar a eles esse poder?
3. Fazer a diferença
Cresce o número de pessoas que
querem fazer uma contribuição positiva para as pessoas e colocar seus valores
em prática. Esse desejo está ligado à busca de um senso de propósito, ao desejo
de olhar para trás, na velhice, e sentirmos que deixamos a nossa marca.
Peter Singer, argumenta que a
nossa maior esperança de alcançar realização pessoal é dedicando à nossa vida a
uma “causa transcendente”, maior do que nós mesmos.
No geral, pensamos que fazer a
diferença está ligado a trabalhos nobres e humanitários como ativistas sociais,
médicos, bombeiros e etc. Todavia, Viktor Frankl dizia que a busca de sentido
está muito mais ligada ao COMO fazemos algo do que ao O QUE fazemos. Assim, um
médico que atua de forma mecânica e fria pode encontrar muito menos sentido em
seu trabalho do que um frentista que atua de maneira empolgada e apaixonada no
seu dia a dia. Um médico que recebe o paciente em sua sala sem olhar no olho,
se interessar de forma genuína faz muito menos diferença na vida de uma pessoa,
do que um frentista que te recebe com um bom dia, te conhece pelo nome e dá um
sorriso enorme para seu filho no banco de trás do carro.
4. Cultivar Paixões e Talentos
Aqui a busca de sentido está
ligada ao “faça o que gosta e aquilo em que você é realmente bom”. Pat Kane
argumenta que devemos nos esforçar para desenvolver uma “ética da diversão” em
nossas vidas, o que coloca “você mesmo, suas paixões e seus entusiasmos no
centro do mundo”. Isso envolve não termos uma distinção nítida entre trabalho e
diversão, entre mente e corpo.
Para Roman um dilema que surge
quando temos a intenção de seguir nossos talentos é se devemos procurar ser
especialistas, nos concentrando em uma única profissão ou generalistas,
desenvolvendo nossos vários talentos e paixões em diferentes ramos do saber. A
cultura ocidental, com a herança da Revolução Industrial, nos ensinou a
especialização. Todavia, os consultores de carreira têm mostrado, com cada vez
mais força, que dentro de cada um de nós existem múltiplos “eus” para serem
explorados.
A pergunta que lhe faço no
final desse artigo é:
Por que você trabalha?
Para ganhar dinheiro? Para ter
status? Para fazer a diferença? Para expressar seus talentos?
Qual é o sentido do seu
trabalho?